ESTUDO POR ESPECTROSCOPIA RAMAN DO EFEITO DA TEMPERATURA NA ESTRUTURA DA ÁGUA


Ana Maria Pereira Neto (IC) e Oswaldo Sala (PQ)

Depto. de Química Fundamental, Instituto de Química - USP


palavras-chaves: espectro Raman, estrutura da água, efeito de temperatura.


Apesar de sua importância em química e em sistemas biológicos, a estrutura da água líquida é ainda um assunto de controvérsia. Devido a sua molécula ter dois centros doadores e aceptores de prótons, a água forma uma rede de ligações de hidrogênio.

Na região do estiramento OH (2700 a 4000 cm-1), há uma distribuição contínua em relação aos parâmetros energéticos e geométricos das ligações de hidrogênio (modelo contínuo), que é perturbada com a variação de temperatura (fig.1), que enfraquece gradualmente as ligações de hidrogênio com o seu aumento, intensificando bandas de alta freqüência e diminuindo as de baixa. Nota-se que bandas de baixa freqüência representam um maior grau de estruturação e as de alta freqüência podem chegar a representar até água monomérica. O número de ligações de hidrogênio varia não só com a temperatura, mas também com a concentração de diferentes sais dissolvidos; no caso da perclorato de lítio (Fig. 2) há formação de par-iônico, que intensifica o efeito de temperatura.


Figura 1 . Espectros Raman da água em temperaturas Figura 2 . Espectros de solução de LiClO4 de 0o a 90 oC (numeração crescente com a temperatura). nas temperaturas e concentrações indicadas


Muitos autores investigam o espectro Raman da água em diferentes temperaturas (-33o a 314 oC), com variação de pressão, bem como soluções de diferentes sais. A maioria deles estuda as componentes isotrópicas (Ia) e anisotrópica (Ib) e utilizam diferente número de constituintes da banda do estiramento vibracional do OH. Existe na literatura grande discrepância no ajuste de curvas ("fit") para esta banda larga, variando o número de componentes de três a seis. Neste trabalho procurou-se uma metodologia que fornecesse um número de componentes com algum significado, não sendo somente um ajuste matemático. Com este objetivo obteve-se espectros Raman da água em diferentes temperaturas (de 0 a 90

o C) e de soluções de perclorato de lítio nas mesmas temperaturas e em várias concentrações. Os espectros foram registrados com polarização perpendicular e paralela à direção do campo elétrico da radiação incidente.

O método consiste em efetuar a diferença entre espectros com diferente polarização, em várias temperaturas. Como exemplo subtrai-se do espectro com polarização paralela o espectro com polarização perpendicular, para a mesma temperatura, ajustado por um fator multiplicativo para reproduzir a contribuição desta componente na primeira, eliminando-se esta componente. Obtém-se, assim, uma curva mais simples cujo ajuste leva a quatro componentes. A banda perpendicular fornece facilmente, por ajuste de curvas, três componentes, das quais uma é coincidente com uma das quatro já obtidas. Resulta, assim, um conjunto de seis bandas, que denominaremos "base". As intensidades destas bandas base em função da temperatura (fig. 3) fornecem equações que permitem reproduzir uma banda para qualquer temperatura. Para isto, constrói-se curvas gaussianas, utilizando a freqüência e meia largura das bandas base, e efetua-se a soma das mesmas (G1+G2+...+G6) como observa-se na fig.4. Nesta figura, o espectro da solução de perclorato de lítio 1,5M a 45 oC foi construido com as gaussianas obtidas da "base" do espectro de água na temperatura de 60 oC. Isto ocorre devido ao efeito de temperatura e de concentração na solução de LiClO4 corresponder ao efeito da temperatura (60 oC) na estrutura da água.

Com este método obteve-se para a base um conjunto de seis bandas, centradas em: 3038, 3174, 3237, 3416, 3550 e 3628 cm-1. Com este conjunto podemos reproduzir não somente os espectros da água como também os de soluções de LiClO4 (fig.4).





Figura 3. Intensidade das bandas "base" em Figura 4. Espectro de LiClO4 construido

função da temperatura. com a soma das gaussianas (Gi).


(FAPESP)